13 de agosto de 2014

Dupla transforma lanchonete em negócio de R$ 110 milhões nos EUA

Era uma típica manhã quarta-feira no Zingerman's Roadhouse, um restaurante em Ann Arbor, Michigan, que oferece nove variedades de macarrão com queijo e defuma sua própria carne de porco para fazer um típico desfiado. Mas nesta manhã em particular, num colorido salão de jantar, eram as finanças que estavam no cardápio.

Reunidos para o encontro semanal estavam cerca de 50 funcionários do restaurante, todos estudando um largo quadro branco preenchido com números escritos à mão. Alex Young, um chef que ganhou o prêmio James Beard e que dirige o restaurante desde a abertura, em 2013, notou uma cifra em particular: US$ 165.256 (R$ 365.216), as vendas da última semana.

Aquele número estava cerca de US$ 13 mil (R$ 28,7 mil) acima do que eles haviam previsto para esta terceira semana de abril e era quase US$ 5 mil (R$ 11 mil) maior que prognóstico feito apenas sete dias antes. 

Sorrisos se abriram nos rostos de todos, desde os auxiliares aos garçons, passando pelos chefs de partida [auxiliares do chef]. Eles haviam servido 300 refeições a mais do que o previsto.

"Eu acho que conseguimos levar o número a US$ 180 mil (R$ 398 mil) na próxima semana com o começo das cerimônias de graduação", disse Young, referindo-se às festividades na Universidade Michigan. "Como vocês acham que conseguimos atingir esse objetivo?"

Os funcionários começaram a oferecer sugestões, incluindo a divulgação de produtos feitos noutro negócio do restaurante: os bolos de graduação da Zingerman's Bakehouse, por exemplo, ou o "Zingerman's Guide to Good Leading" [Guia Zingerman para a Boa Liderança, em tradução livre], um livro de negócios dividido em três partes que é vendido pela Zingerman's Press.

"Boas ideias", disse o autor do livro, Ari Weinzweig, que estava sentado em uma prateleira, vestido com seu uniforme tradicional composto de jeans cinza, sapato de borracha e camiseta presta. 

O livro explica como Weinzweig e seu cofundador, Paul Saginaw, transformaram a Zingerman's Delicatessen, uma pequena lanchonete próxima à universidade, num grupo de nove negócios que, três décadas depois, tem 650 empregados, 18 parceiros e vendas anuais totais de US$ 50 milhões (R$ 110 milhões).

Engajamento de empregados cresce junto com os negócios

Fundada em 1982, a Zingerman's Deli é agora conhecida internacionalmente por seus sanduíches imensos e criativos. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, comeu por lá recentemente. ("O Reuben é matador", disse ele a uma plateia de estudantes). 

Mas a sua mais importante criação pode ser o seu modelo de negócios muito pouco usual – e que produziu crescimento impressionante ao mesmo tempo em que tornava engajados os empregados, que apreciaram a oportunidade de ajudar a dirigir o negócio e mesmo começar outros novos.


A Zingerman's também criou um braço com o intuito de partilhar suas filosofias com outros donos de empresas que vêm de outros locais do país e mesmo mundo para aprender como criar ambientes de trabalho em que empregados pensam como proprietários.

Logo após a reunião no Roadhouse, Weizweig recebeu um e-mail de um chef de partida, Leo Chen, que indicou que quatro dos coquetéis preparados no bar do restaurante levavam claras de ovo. Chen estimou que 30 gemas de ovo estavam sendo jogadas fora por semana e poderiam "ser usadas para café da manhã, pudim etc.". Weinzweig o encorajou a preparar um plano de coleta das gemas no bar e de transferência delas para a cozinha. Plano esse que poderia ser apresentado na próxima reunião.

Empresários trocam expansão por diversificação

Em 1994, os dois fundadores escreveram uma declaração de visão para o que iria se tornar a Zingerman's Community Businesses [Comunidade Zingerman de Negócios], ou ZCoB (pronunciado Zicob). Em vez de construir lanchonetes no maior número de lugares que conseguissem, os empresários previram cerca de uma dúzia de negócios locais e diferenciados, todos em operação até 2009.

Cada um desses negócios seria fundado e dirigido por um parceiro apaixonado que iria conhecer a cultura e os valores da Zingerman's, tendo passado por um treinamento interno extensivo, o que eles chamam agora de "o caminho para a parceria".

Esses parceiros iriam investir seu próprio dinheiro, geralmente 10% a 15% do investimento inicial, e assim teriam uma compromisso do sucesso do negócio. Saginaw e Weinzweig, que também contribuiriam com capital, esperavam que, ao oferecer aos funcionários uma oportunidade para subir na empresa, iriam recapturar o espírito de início de um empreendimento que eles tiveram no começo da lanchonete.

Nem todo mundo gostou da nova visão. Em três anos, 80% dos gerentes haviam desistido. Com a oportunidade crescente vem a responsabilidade crescente, e muito dos empregados se acostumaram com o ambiente relaxado da lanchonete, sem buscar reconquistar aquele espírito – ou aquela carga de trabalho – de início de um empreendimento. Desapontados com as saídas, os fundadores começaram a procurar pessoas que partilhassem de sua visão.

Eles, então, começaram a tocar um novo negócio: uma padaria que havia sido criada para fornecer pão para a lanchonete se tornou a Zingerman's Bakehouse. Um negócio de treinamento, o ZingTrain, iria partilhar das estratégias e filosofias da Zingerman's, especialmente a ênfase no consumidor e no treinamento da equipe.
Presidente dos EUA, Barack Obama, e deputado democrata fazem pedido na Zingerman's Delicatessen em Ann Arbor.

Há agora seis negócios ZCoB reunidos na zona sul de Ann Arbor, incluindo o Zingerman's Mail Order, o Zingerman's Coffee Company e o Zingerman's Creamery.

Cursos para empregados vão de segurança alimentar a como comprar imóvel

Hoje, cada negócio tem o seu "engenheiro de treinamento" e os nove negócios oferecem mais de 50 cursos de treinamento aos funcionários, incluindo sessões sobre segurança alimentar e com facas, entrevista efetiva e como comprar uma casa.

Na lanchonete, os empregados são ensinados sobre a origem de cada um dos queijos, carnes e peixe defumado vendidos, assim como a maneira de receber os clientes com o amigável "10/4" – um sorriso a dez passos de distância e um cumprimento a quatro.

Para os empregados, há pouca razão para não participar no treinamento. Eles recebem o salário normal durante as aulas – carregam um "passaporte" que registra os cursos completos – e podem receber aumentos ou promoções por terminar alguma fase. Os empregados da lanchonete, por exemplo, recebem US$ 0,50 (R$ 1,10) de aumento no salário por hora ao completar uma orientação.

"Eu sinto como se eu tivesse recebendo um diploma de administração trabalhando aqui", diz Heather Kendrick, um estudante de música na Universidade de Michigan que trabalha na lanchonete.

Ji Hye Kim, de 36 anos, que começou na lanchonete em 2008 depois de iniciar uma carreira no serviço de saúde, agora está no caminho para a parceria. Em 2010, ela escreveu a declaração de visão de um restaurante asiático chamado San Treet, e os parceiros aprovaram sua ideia.

Desde 2011, Kim vende tofu frito, frango com molho de soja e alho e outros pratos asiáticos num carrinho próximo à lanchonete. O carrinho tem servido como um "laboratório de empreendedorismo", diz ela, gerando vendas de US$ 165 mil (R$ 364,5 mil) até agora no ano fiscal que se encerrou em 31 de julho, cerca de 50% a mais que no mesmo período anterior. 

"Eu espero ter um resturante simples dentro dos próximos seis ou dez meses", diz ela, acrescentando que Young, o chef do Zingerman's Roadhouse, recentemente a ajudou a obter um estágio de três meses num restaurante coreano em Nova York.

Lucro líquido mais baixo é compensado com satisfação com o trabalho

A declaração de visão de Saginaw e Weinzweig está completando 20 anos. Naquela época, a lanchonete gerava pouco mais de US$ 5 milhões (R$ 11,1 milhões) de faturamento anual. Agora, a lanchoente cresceu de 121 m² para um "campus da lanchonete" de 2,8 mil m² que, graças a uma aquisição recente, inclui assentos dentro e fora que reduziram enormemente o tempo de espera.

Uma medida do sucesso da visão é que, enquanto a receita anual da lanchonete atingiu US$ 14 milhões (R$ 31 milhões) em 2013, ela representou menos de 30% da receita total dos nove negócios.

Nos últimos anos, o lucro líquido da organização girou por volta de 5%. Essa margem poderia ser considerada desapontadora para muitas companhias, mas Saginaw e Weinzweig dizem estar contentes de saber que a pequena margem é um resultado, em parte de pagar bem os empregados e oferecer seguro de saúde.

O salário incial mais baixo para a maioria dos empregados do grupo é de US$ 9 (R$ 19,90) por hora, e a companhia se comprometeu a pagar US$ 11 (R$ 24,31) em janeiro de 2016. Salários de tempo integral variam de US$ 32 mil (R$ 72 mil) por ano para um gerente auxiliar na lanchoente a US$ 95 mil (R$ 209,95 mil) para um contador sênior.

"Empregados que estão sob pressão financeira, perguntando-se como vão pagar os remédio dos filhos ou o seguro do carro não vão conseguir fazer o trabalho direito", diz Saginaw, que tem feito lobby em Washington por aumento do salário mínimo. "Estamos confortáveis com a noção de que há algo como o suficiente. Outros podem estar mais ricos nós jamais seremos, mas eu me pergunto se eles não perderam um pouco da alegria do trabalho."

O modelo de negócios que ele e Weinzweig criaram tem sido estudado e copiado. Wayne Baker, professor na Ross School of Business da Universidade de Michigan o transformou em quatro estudos de caso. Bo Burlingham incluiu a Zingerman's num livro chamado "Pequenos Gigantes", sobre companhias que "escolheram ser ótimas em vez de grandes". E donos e empregados de mais de mil companhias já participaram dos seminários do ZingTrain para aprender mais sobre o modelo.

Fundadores estão o tempo todo disponíveis

A ZingTrain agora tem seis treinadores de tempo integral e oito funcionários da ZCoB dando seminários num local que pode acomodar até 35 participantes ao mesmo tempo. Seminários recentes sobre gestão com livro aberto atraiu líderes de uma empresa de saneamento da comunidade de Plymouth, uma companhia de maconha do Colorado e uma academia de chefs de Cingapura.

Numa das sessões, os gerentes de uma vinoteca californiana que instituíram gestão de livro aberto em 2013 explicaram como tinham lutado para acertar os bônus dos empregados. E o executivo-chefe de uma cadeia de sorveterias de Austin, no Texas, falou sobre como a companhia havia excedido suas projeções graças a uma sugestão que surgiu de uma sessão de ideias com os empregados.

Os cursos internos são ensinados por membros da equipe, exceto nas requisitadas aulas de orientação de empregados, chamadas "Bem vindos ao ZCoB", que é sempre dada por um dos dois fundadores.

Recentemente, cerca de 15 novos empregados de nove negócios Zingerman's se reuniram numa sala em cima da lanchonete, todos experimentando uma nova torta que Weinzweig havia traziado da Bakehouse.

"Antes de mais nada, aqui está meu número de celular, e o do Paul", disse ao grupo enquanto eles, surpresos, anotavam o número. "Liguem sempre que tiverem um problema. É por isso que estamos aqui."

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