8 de dezembro de 2013

Reunião em Bali é decisiva sobre futuro da OMC e Rodada Doha

Autoridades mundiais reúnem-se a partir do dia 03 de dezembro em Bali, na Indonésia, para um encontro que pode decidir o futuro da Organização Mundial do Comércio (OMC).

A entidade responsável por resolver disputas entre países e promover a liberalização comercial no mundo atravessa um teste de fogo sem precedentes.


Além do futuro da OMC, também está em jogo a Rodada de Doha — negociação, emperrada há 12 anos, para liberalizar o comércio entre os 159 países-membros da instituição.

Neste ano, o brasileiro Roberto Azevêdo foi eleito diretor-geral da organização com a promessa de trabalhar para destravar as negociações.
                       Roberto Azevêdo: "Um acordo é possível. Mas é agora ou nunca."

Na abertura do encontro, Azevêdo disse que um acordo é possível, mas que deve ocorrer durante a reunião em Bali.

"Um acordo é possível. Mas é agora ou nunca. Se os ministros puderam tomar as decisões políticas para lidar com os obstáculos remanescentes, então teremos um pacote e, assim, teremos novamente um vibrante sistema multilateral de comércio", disse.

"A OMC atravessa uma longa noite e espero que em Bali possamos observar o alvorecer de um novo mundo."

Relevância

"Se não houver acordo, a organização perderá relevância. Hoje, a OMC é uma organização do século 20, criada em torno de regras que não correspondem mais à realidade", afirmou à BBC Brasil Umberto Ciello, professor de Direito Internacional da Faculdade de Direito da USP e Diretor da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP.


Segundo o especialista em leis de comércio internacional, o sucesso das negociações em Bali garantiria a sobrevivência da própria OMC e seu futuro.

Apesar disso, o próprio diretor-geral já trabalha com perspectivas de sucesso apenas parcial. À frente da OMC há três meses, Azevêdo admitia em setembro um "pacote de Bali parcial" e deixou claro que o sucesso das negociações "dependeria da vontade política dos Estados-membros".

Multilateralismo em xeque

O pacote de Bali inclui três grandes temas: redução de burocracia alfandegária, agricultura e medidas para países pobres expandirem exportações.

Um dos riscos da organização é se tornar irrelevante como plataforma de negociação comercial. Hoje, há uma tendência crescente dos países de apostar em acordos bilaterais de comércio em vez de recorrer à OMC como fórum regulador.

"O problema disso é que regras são criadas, mas poucos membros da OMC estão participando do processo, o que enfraquece a organização", explicou Celli.

Um exemplo de movimento paralelo à OMC é o Acordo de Associação Transpacífico (TPP, na sigla em inglês), um tratado firmado recentemente entre os Estados Unidos e países da região da Ásia-Pacífico com novas regras de comércio e investimentos. Em tese, acordos deste tipo deveriam ser feitos dentro do âmbito da OMC.

Ameaça indiana

Outro fator-chave para o desfecho de Bali é a posição da Índia nas negociações. Na semana passada, após reuniões preliminares dos países-membros em Genebra, a Índia declarou que não abriria mão dos subsídios agrícolas.

Em 2014, o país vai iniciar um programa de distribuição de alimentos a baixo custo para mais de 800 milhões de pessoas e não quer limitar os subsídios agrícola a 10% de sua produção nacional — como estipulado nas regras da OMC.

Uma "cláusula de paz" permite que os países concedam subsídios além do permitido a seus agricultores por quatro anos para a formação de estoques de segurança alimentar. A Índia, porém, se recusou a respeitar o prazo e pede uma exceção permanente aos países pobres. Vários países-membros exportadores da OMC, entre eles os EUA, rejeitaram veementemente a proposta.

O ministro do comércio indiano, Anand Sharma, que irá liderar a delegação do país em Bali, afirmou em Genebra que o G33 (grupo de países em desenvolvimento), apoiava a posição da Índia sobre os subsídios agrícolas e disse que o tema "não era negociável".

Na realidade, porém, apenas sete países (Argentina, África do Sul, Venezuela, Cuba, Bolívia, Nicarágua e Equador) oficialmente apoiam a empreitada indiana por hora.

"A Índia está praticamente sozinha nesta exigência, acredito que haverá bastante pressão internacional para assinar o acordo", afirmou o professor Celli.

Vantagens para o Brasil

O governo brasileiro não se pronunciou oficialmente sobre a posição indiana na OMC, mas o Itamaraty divulgou nota na semana passada, declarando que "continuará trabalhando com todos os membros da OMC com vistas à aprovação de acordos que permitam a expansão das trocas comerciais, em linha com o espírito que norteia a Rodada de Desenvolvimento de Doha".

O titular do Itamaraty, Luiz Alberto Figueiredo Machado, chefiará a delegação brasileira em Bali.

A CNI (Confederação Nacional da Indústria), no entanto, criticou a Índia.

"O pedido pode ser legítimo, mas o Brasil não pode concordar com esse tipo de 'cheque em branco' para os indianos, pois o mercado asiático é bastante atrativo e importante para a agroindústria", afirmou em comunicado.

Segundo a OMC, um dos resultados imediatos da aprovação do pacote Bali seria um ganho econômico de bilhões de dólares (estimativas sobre a facilitação de comércio giram em torno de US$ 1 trilhão em negócios adicionais ou redução de custos).

Já a CNI prevê que um acordo em Bali trará benefícios significativos para a indústria e estima que o potencial de redução dos custos de transação comercial chega a 14% para manufaturados e 10% na média geral.

Pesquisa recente da CNI com 700 empresas indicou que a burocracia alfandegária só perde para o câmbio entre os problemas que mais atrapalham as exportações.

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